terça-feira, 26 de julho de 2011

Paraiso? O que é isso afinal?

Paraíso? O que é isso afinal? Para uns é um lugar mágico, como nos contos de fadas, daqueles que nos liam em crianças antes de adormecemos, em que existe uma princesa e um príncipe, cavalgando num cavalo branco, empunhando a sua espada para salvar a donzela que foi raptada pela madrasta má que a prendeu numa torre. Para outros, o paraíso é como naquelas histórias, em que os jovens são obrigados a fugir, por terem uma paixão proibida, pois os seus pais são inimigos, e acabam por viver a mais linda história de amor. Para alguns é um sítio com os mais bonitos animais e os maiores castelos, um lugar onde os pássaros cantam ao nascer do sol e à noite ouve-se o ressoar dos grilos, trazido pelos ventos. Enfim, para umas pessoas o paraíso é um simples lugar enfeitiçado, longe da realidade. Para outros é um lugar distante, mais distante que os distantes, onde reinam as trevas, onde os muros dos castelos guardam os gritos de dor e pânico que tantas vezes saiam das masmorras, um sítio onde o medo pesa no ambiente, um sítio onde a liberdade de expressão não existe, onde apenas uma e só uma pessoa pode reinar e os outros apenas obedecer. Outros há, que desenham o seu paraíso como sendo um lugar misterioso, onde cada árvore, cada planta, cada raiz, guarda uma história, a sua história, um lugar infinito, onde podem explorar durante séculos e nunca acabar por descobrir tudo o que é necessário descobrir. Paraíso? O que é isso afinal? Uma espécie de reservatório, onde as pessoas se escondem dos problemas do dia-a-dia? Um lugar mágico ou tenebroso? Distante ou perto? As pessoas complicam a sua definição, complicam o que pode ser o paraíso ideal. Mas eu não. Para mim o paraíso é uma coisa simples, uma coisa fácil de projectar, para mim ele é apenas e só um sítio onde possa fazer a minha vida sem problemas, onde possa gritar quando me apetece faze-lo, um sitio em que possa correr livremente para descarregar energias, um sitio em que possa lutar pelo que quero sem ter alguém a mandar-me constantemente abaixo, um lugar com os melhores do meu lado e isso basta-me.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

O mar é fiel

Chego à praia. Estou sozinha. É inverno e está frio, muito mesmo. Mas eu não me importo. Começo a tirar as camisolas, a descalçar as botas e as meias, ficando em biquíni. Um casal de idosos que está a abandonar aquela pequena praia, olha para mim, achando-me maluca, por estar assim vestida, em pleno inverno, quando eles vestem mais casacos do que a minha família toda junta. Sinceramente, pouco me importa o que eles acham. Abandonando as coisas na areia, corro para o vasto oceano, parando à beira mar, molhando apenas os pés. Imediatamente sinto-me calma, como que em paz. O mar é fiel. O mar, quer esteja cheio, quer esteja vazio, está lá sempre, para me ouvir, acalmar, para levar os meus problemas com a maré. Avanço em direcção às ondas e mergulho. Volto à superfície e fico a boiar, olhando o céu. Para uns o mar é medo, para outros um desafio mas para mim, o mar é sítio onde me sinto completa, é onde me sinto bem, feliz. Nele sinto que nada me pode atacar, o meu corpo sente-se protegido dos males e a minha mente dos barulhos da cidade, dos problemas da vida. Aos poucos o meu corpo vai-se habituando à baixa temperatura da água, começando a achá-la quente, reconfortante. Nado mais um bocado até que decido regressar a terra firme. Chegando a ela, deito-me na areia molhada, de barriga para cima e fecho os olhos. Ouço o murmúrio das ondas, escuto os segredos que a Mãe Natureza tem para me confidenciar, os mistérios que aquele lugar guarda, as histórias que recorda. Uma onda maior do que as outras chega até ao sítio onde estou não ralo, pois ela rapidamente volta ao sitio de onde veio.
Um caranguejo sobe pela minha barriga, aninhando-se nela. Não me mexo, gosto daquela sensação, até. Sabe bem saber que algo daquele paraíso gosta do meu ser, algo daquele lugar sente-se protegido ao meu lado. Bom saber que pelo menos ela, aprecia a minha companhia, por mais pequena que ela seja.
Passado instantes, sinto o pequeno a ir embora, ir ter com a família que está lá mais adiante. Finalmente abro os olhos, devagar, fitando o céu, tão cinzento, com pequenos raios do sol tentado passar pelas carregadas nuvens.
Sento-me de joelhos encostados ao peito com os braços a envolve-los. Fixo o mar, tão belo que ele é. Tão calmo. Porque não são as pessoas assim?, é a pergunta que me vem à cabeça. Porque não são elas calmas como o mar? Talvez achem que as confusões são a melhor solução, a única saída dos problemas. Oh, como estão erradas, as pessoas. Deviam aprender mais, com o mar.
Está a ficar tarde, tenho de voltar. Levanto-me e reparo que já estou seca. O tempo passou a voar, mas não importa. Acima de tudo, devemos ter tempo para perder tempo, e o meu é hoje. Sacudindo a areia de mim, começo a caminhar para o lugar onde está a minha roupa. Apenas visto as calças. Provavelmente está frio, mas eu não o sinto. Pelo contrário, sinto uma enorme chama dentro de mim, a aquecer o meu corpo, o meu sangue. Pego na roupa e enfio-a na mala. Viro-me uma última vez para o mar, pondo a mala ao ombro. Sorrio. É bom saber que aconteça o que acontecer ele, o mar, não vai desaparecer, é bom saber que quando estiver mal, posso contar com o mar para me ajudar. Desejava tanto poder ficar ali mais tempo, naquele lugar. Mas não posso, por mais que custe, eu não posso. O meu telemóvel toca, chamando-me à terra. Atendo. É a minha mãe. Asseguro-a que está tudo bem comigo e que já estou a regressar a casa. Desligo e, contra o que o meu coração me diz, volto para o mundo que me espera lá fora.

(...)

E lá fui eu. Lá sai eu de minha cama para me ir juntar a quem mais em ouvia. Saindo quando todos entravam, percorri as ruas, naquele momento, desertas para me encontrar com ninguém. Andei alguns metros, senão mesmo quilómetros. Parei num banco de jardim, tapado por uma árvore enorme e antiga. Subi para o assento do banco, de pé. De seguida, equilibrei-me no encosto para as costas e trepei para um pequeno ramo da árvore, e depois para outro e para outro para depois chegar a um forte e grande ramo. Sentei-me nele. Encostei-me ao tronco da árvore, de joelhos junto ao peito. Fechei os olhos e escutei. Escutei o que ela, a árvore, tinha para me dizer. Então ela segredou-me “Há anos e anos atrás, nesse mesmo ramo onde tu te encontras, sentava-se uma donzela que, para se esconder do seu Marido que tanto lhe batia e massacrava, trepava para mim. E eu acolhia-a assim como estou a fazer agora com o teu ser, dava-lhe o sentimento de protecção que ela mais necessitava para viver” contava a velha árvore, embalando-me naquela brisa que se formava no ar. “Certo dia, o seu marido, desconfiado que ela não cumpria as suas regras, decidiu esconder-se fora de casa e observá-la. E a mulher lá foi, contra as regras do seu homem, ter comigo, naquela altura nada mais do que uma simples árvore, do tamanho das outras.” Os meus olhos começavam a fechar-se lentamente. “Quando o homem descobriu que ela infringia suas regras, ficou furioso. Então a mulher, quando chegou a casa, encontrou o homem, sentado no banco de cinto na mão.” O meu coração deu um pulo ao ouvir esta última frase. De imediato abri os olhos e tornei-me atenta. “A mulher tentou arranjar uma desculpa por ter saído de casa, mas o homem sabia, sabia onde é que ela tinha ido. De imediato o homem dirigiu-se para ela, e começou a esmurrá-la. A pequena nem metade da força do homem tinha, portanto apenas gritou, implorou-lhe para que ele parasse mas ele não o fazia” Os meus olhos encheram-se de lágrimas ao ouvir aquele relato. “A mulher com medo, nunca mais saiu de casa. Então os seus vizinhos achando estranho este comportamento, decidiram juntar-se e ir até casa dela, quando o homem saísse. Meu dito, meu feito, nessa mesma noite, 5 homens bateram à porta de casa dela. A mulher, com medo que o marido descobrisse, nada fez. Mas os homens continuavam a insistir e a insistir e ela, a medo, acabou por abrir a porta. Quando o homem da frente a viu, naquele mísero estado, apenas a abraçou e ela, desabou num choro intenso. Logo houve alguém que lhe perguntou porque estava ela assim e ela, lavada em lágrimas, contou que saia quando o marido ia trabalhar, coisa que ele a tinha proibido e há umas noites tinha descoberto, e para a castigar tinha-lhe feito aquilo.” Eu estava mais atenta do que nunca, queria que o fim chegasse, e depressa. “Mal os homens chegaram a casa, relataram a história contada pela pobre mulher. Ficaram todos chocados, principalmente as mulheres. Acabaram por decidir então que se a mulher não respondia, faziam-no eles por ela. Então, certa noite, quando o homem saiu para trabalhar, foi surpreendido por um bando de pessoas. O que lhe fizeram? Ninguém sabe, mas todos dão a sua opinião. Os homens limitaram-se a levá-lo e depois de horas, traze-lo de volta para a porta de casa. A mulher, quando acordou de manhã, foi até à porta e, ao deparar-se com o homem naquele estado, imaginou-se a si, ali estendida no lugar do homem em vez deste mesmo. Rapidamente lembrou as noites de sofrimento e dor causadas por ele. Sabes o que fez ela?” sussurrou-me a árvore. Abanei com a cabeça, negativamente. “Arrastou para o quarto e deixou-o lá, como ele fazia com ela, deixou-o lá. A mulher? Apenas mudou de casa, fez as malas e foi-se embora.” Logo me perguntei se tinha ela descoberto quem tinham sido os responsáveis. A árvore deve ter escutado a minha pergunta, pois logo acrescentou num sussurro: “Antes de partir, a mulher falou aos homens daquela noite, agradecendo-lhes o facto de a terem libertado, de lhe terem dado forma de viver a vida. Depois, no seu caminho, passou por mim e sentou-se nos meus ramos para, uma última vez, sentir o sentimento de protecção que tantos anos lhe tinha dado. Quanto ao homem? Ninguém sabe se ele sobreviveu ou não mas a verdade é que também ninguém quis saber” No final daquela história os meus olhos estavam banhados em lágrimas.