quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Porque tudo é incerto. Porque tudo muda. Porque nada se mantém. Porque seguramos o vazio, na esperança que nos traga o tudo. Porque nos agarramos ao nada, na esperança de que ele nos agarre de volta. Porque nos resguardamos no silêncio, na esperança de que alguém nos oiça. Porque ouvimos, na esperança que um dia nos ouçam. Porque nos calamos, na esperança de um dia falar. Porque paramos, na esperança de um dia agir. Porque nos contemos, na esperança de que alguém note. Porque ficamos, na esperança de um dia ir. Porque sonhamos, na esperança de um dia alcançar. Porque desejamos ser, na esperança de um dia lá chegar. Porque queremos, porque fomos, porque seremos. Porque isto. Porque aquilo. Porque tudo.

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

É de noite que tudo acalma. 
Costumam dizer que é quando tudo piora. Que tudo vem, que tudo ataca. Comigo, não. De noite vem o silêncio. Vem a paz. Não há ruído de fundo, não há carros, não há pessoas, não há alarmes. Não há responsabilidades, não há deveres. O dia acabou. Já foi. Mais um.
O tempo passa mas não passa. O ponteiro do relógio anda, segundo após segundo, porém, é como se estivesse parado. Os minutos não importam. As horas muito menos. O tiqtaq constante nem se ouve. Irrelevante, esquecido.
De noite, posso pensar. Posso reflectir. Posso ser eu, só eu, e mais ninguém. Posso deambular, vaguear, pelos confins da subconsciência, onde a memória se fundiu com a imaginação. Posso ver o irreal. Tocar-lhe, senti-lo entre os dedos, sem que me escape. De noite, simplesmente, posso. Ninguém está acordado para me impedir. Ninguém está acordado para me despertar de um sonho de olhos abertos. Sou só eu.

terça-feira, 14 de junho de 2016

    A caneta foi substituída pelo teclado, o papel pela tela, o som do bico a raspar na folha pelo som dos dedos nas teclas. Quase sem darmos por isso, fomos transferidos para um novo mundo, onde as letras aparecem sem as formarmos. Transferimos o que pensamos através de fios, uma extensão do nosso ser que talvez se assemelhe mais a ele do que o caderno que guardamos na prateleira, esquecido e com pó. Uma evolução, diriam os entendidos. Porém, não sabe a evolução. Sabe a uma perda, como a de um colega que mudou de escola. Como a inocência que chegou ao fim, quase sem dar-mos conta.