A música está baixa. Mais alta, seria impossível de suportar, a minha cabeça não dá para mais. No entanto, parece ter um volume excessivo, naquele quarto vazio. Naquela casa vazia. O som ressoa, pelas paredes, pelo ar, por mim. Faz-me desabar, mais uma vez. Não consigo mais com isto. Sou tão fraca, tão estúpida.
- Lua?
Oiço a voz do Frederico, lá fora. Que saudades. Levanto-me, tentando recompor-me - algo inútil, sei disso. Desço as escadas, mas sinto-me uma tontura, o que me obriga a agarrar o corrimão com todas as forças, para não cair. Abro a porta e a luz encandeia-me. Ponho uma mão à frente dos olhos e desvio o olhar. Aquilo queima.
- Hey.. - sinto a mão dele na minha cintura, enquanto a outra fecha a porta - como estás?
Agora, sem tanta luz, posso desproteger os olhos. Mesmo assim, não o encaro. Não consigo. Por mais que me lembre que é o Frederico, a pessoa em quem mais me confio. O Frederico, a pessoa que mais me apoia. Não consigo. A minha figura é dececionante. Para qualquer pessoa. Até para mim. Não me vejo ao espelho à algum tempo, mas devo ter os olhos inchados, o cabelo despenteado e a minha cor não deve ser muito boa.
- Lua, olha para mim.
As lágrimas estão demasiado próximas, demasiado.
- Desculpa, Frederico. Desculpa.
Não te acanhes, ele é o teu namorado, podes chorar com ele. Ele já viu a minha fraqueza uma vez, não tem de a ver uma segunda. Deixa-te disso, Lua, ele não te vai julgar. Mas vai pensar que sou fraca.
- Desculpa de quê? Lua, tu não tens culpa. De nada. Porquê isso.
Ele abraça-me. Encosta-me a si, tão perto, consigo sentir-lhe a respiração. Isso acalma-me. Pouco, mas acalma. Tenho que inspirar fundo várias vezes, antes de conseguir formar uma frase, propriamente dita. A minha garganta não deixa passar nenhuma palavra compreensível.
- Eu afastei-me de ti, deixei que a dor, a minha dor - tem calma Lua, está tudo bem - criasse uma distância entre nós.
Tenho que parar. Por um momento. As lágrimas já correm pelas faces, por mais que eu as tente parar, não consigo.
Dediquei-me ao meu sofrimento e deixei-te de parte - a minha voz está tão fraca - Durante muito tempo, demasiado tempo.
Calma.
- Mas eu entendo, não tem mal.
- Tem sim, eu sei que tem. Eu não devia ter-me afastado, não devia.
Abraço-o com ainda mais força. Como se isso remendasse a distância que foi crescendo entre nós nas últimas semanas.
- Lua, vá lá. Eu já disse que não me importo. Precisaste de tempo para ti, qual é o mal disso?
- Ter-te deixado de parte.
A frase paira no ar.
Fui estúpida, magoei-o, que parva. Não magoaste nada, o Frederico é mais compreensível do que isso. Isso não quer dizer que não sinta, e que a distância não o tenha magoado. Mas ele entende. Ele não merecia.
Ele afasta-me de si. Magoei-o mesmo. Eu sei que sim. Eu sei. Obriga-me a olhar para si, mas eu mal o consigo ver, a lágrimas tornam tudo desfocado. Desculpa. Por favor, desculpa.
- Tu não tens culpa. Afastaste, sim, mas e depois? Se estivesses no meu lugar, se fosse eu a precisar de espaço, se fosse eu a refugiar-me em casa, tu entendias-me?
- Claro que sim! Eu entendia, e ajudava-te, óbvio, que sim, tu sabes que sim.
- Então, é o mesmo comigo. Eu entendo, aceito, e estou aqui para te ajudar.
- Tu não merecias que eu me afastasse, eu sei que não - as lágrimas passam a soluços desesperantes, já não vale a pena tentar esconder.
- É verdade. Não merecia. Mas por vezes é assim, levamos com o que não merecemos, pelo bem de quem ama-mos. Eu sabia Lua, eu sei, que dar-te espaço foi o melhor. Eu sei que sim, tu precisavas de pensar, organizar a cabeça. E precisavas de o fazer sozinha.
- Não ajudou em nada, a minha cabeça continua uma confusão.
Ele sorri. Não sei como consegue, com aquele ambiente pesado, o desespero e a dor, mas ele fá-lo. E isso, quase que provoca o meu sorriso.
- A tua cabeça será sempre uma confusão, Lua.
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