Porquê? Porque é que me sinto
assim? Não faz sentido. Ela
não faz parte da minha vida, ela não fazia parte da minha vida. Então porque me culpo? Porque é
que me sinto assim? Ela há muito que já não era uma mãe, há muito que passara a
ser mais um ser vivo neste mundo, há muito que passara a ser alguém que tinha
de tolerar de meses a meses, como se fosse uma estranha que ia a casa só porque
ficava bem. Eu mal me lembro da última vez que senti algo para além de
distância, frieza, mágoa entre nós. A última vez que houve cumplicidade,
perdeu-se com a nossa relação. Não havia nada entre nós. Nada para além de um
grande espaço vazio. Nada para além de meras memórias.
Mas se assim o é, porque é que me
dói tanto? Porque é que a quero de volta. Era
tua mãe. Não, não era. Ela deixou-me! Ela
esteve sempre lá, tu é que não viste. Ela deixou de querer saber de mim. Ela sempre se preocupou. NÃO.
Se ela se preocupa-se, ela teria mo dito, ela teria falado comigo quando eu
precisei. Ela não o fez. Ela
observou-te à distância, ela esteve mais perto do que aquilo que julgas.
- NÃO! NÃÃÃO! ELA NÃO ERA NADA!
E o grito ecoou. Sobre a areia
vazia, através do ar, gelado. Como eu.
Estava
tudo tão bem. Eu tenho 17 anos, estou a terminar o décimo segundo, eu vou para
a faculdade, eu tenho a minha vida construída, encaminhada, porquê? Porquê isto
assim, desta forma?
-
NÃO É JUSTO, NÃO É.
O
choro aumenta. A garganta incha, e as lágrimas rolam pela cara abaixo. Ela não era nada.
-
Lua?
Não,
não o quero ver. Eu quero estar sozinha, preciso de estar sozinha, preciso de
organizar isto tudo, fazer as coisas tomarem um sentido lógico. Eu não o
consigo ver, não consigo. Levanto-me e começo a andar, mas os pés tropeçam um
no outro e caio. Choro ainda mais, por ser tão parva, tão ridícula
tão fraca ao ponto de nem andar conseguir.
-
Lua, por favor, fala comigo.
-
Sai daqui, vai-te embora, por favor.
-
Não... - sinto as suas mãos em mim, a ajudar-me a levantar, a pôr-me outra vez
de pé - fala comigo, que se passa?
-
Frederico, por favor...
Não
consigo aguentar. Ela não era nada, agora é tudo? Eu não me importava com o que
lhe acontecia, agora já importo? Ela não fazia parte da minha vida, de mim,
agora já faz?
-
Lua...
Agarro-me
a ele e começo a soluçar, desesperada. Agarro-me com tanta força, que me magoa
as mãos. Agarro-o como se isso fosse a única coisa que me amparasse, como se
nada mais me mantivesse de pé. Porque nada mais o faz.
Ele
abraça-me, diz-me palavras de consolo. Tenta acalmar-me. Mas não resulta. As
lágrimas aumentam, o coração encolhe, tão pequeno, tenta lutar contra esta dor,
mas não vale a pena. Ela é tão forte, mais forte do que ele, do que eu. Ela era tua mãe. Uma desconhecida. Não.
- Lua – obriga-me a olhar para ele, mas eu mal consigo vê-lo – o que se
passou? Tu não és assim, não choras desta forma, que aconteceu?
Respiro fundo várias vezes, tentando parecer mais forte do que aquilo
que me sinto, do que aquilo que estou, mas mesmo assim, a minha voz soa fraca:
- Ela foi-se embora.
- Ela? Ela quem? A tua mãe?
Aceno com a cabeça, em sinal afirmativo.
- Mas ela vai várias vezes embora, Lua, tu própria o disseste, ela mal
passa tempo em casa.
- Mas desta vez, é de vez…
Ele parece não entender. Não percebe o que digo. O porquê de estar
assim por uma coisa que, aos seus olhos, é tão banal.
- Mudou de casa?
- Não, Frederico, não foi nada disso.
Tenho a respiração ofegante, o coração a bater tão rápido, como se
tivesse saído de uma corrida. A água dos meus olhos, essa ainda cai, sem amparo
possível.
Finalmente, faz-se-lhe um clique na cabeça e entende. Entende o que eu
disse, entende porque choro tanto, entende porque estou assim.
- Oh Lua, lamento imenso.
E abraça-me. A única coisa que impede que eu caía ainda mais.
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