quarta-feira, 5 de setembro de 2012

O mar é fiel 8*

Saio de casa e vou diretamente para a praia. Eu odeio ir à praia à tarde, como já disse, mas eu preciso desesperadamente de o ver. Será que quero mesmo encará-lo depois do que fiz? Deixa de ser parva.
Lembro-me da noite passada. Aliás, não penso noutra coisa o caminho todo. Como ele me ajudou.  E eu nem lhe dei hipóteses. Mandei-o logo embora, não o deixei expressar-se, nem lhe dei margem para dúvidas. Que estúpida! 
Quando estou quase a chegar à praia, ainda não sei o que desejo. Será que o quero ver? Será que não? Não sei, não consigo perceber. Sinto-me irritada. Não com ele, comigo. Por ter baixado a guarda. Por o ter deixado ver demasiado. Estúpida casa. Mas acima de tudo, por o ter tratado de uma forma que ele não merecia. Porque por mais motivos que eu tenha para me enervar, nenhum deles me dá permissão para o tratar assim. 
Quando chego à praia, a minha irritação aumenta. Está cheia. Atulhada. De pessoas. Barulhentas. Inspiro várias vezes, tentando acalmar. Olho para o mar. Como é que consegues estar sempre tão calmo? Cheio de pessoas, ele transborda paz. Só barulho. Não há calma. Mas o mar está calmo. Quem me dera conseguir manter a calma como o meu amigo.
Queria ir à gruta, de novo, mas com tanta gente aqui, será impossível não atrair as atenções. E não quero que ninguém descubra o meu pequeno paraíso. O meu pequeno segredo. Meu e dele. E ao recordar isto, recordo também o Frederico. E sinto vontade que ele esteja ali, ao meu lado, naquele momento. Lembro-me do toque dele, enquanto me ajudava a sentar. Enquanto me ajudava a sair daquela gruta. Enquanto tratava das minhas feridas. Enquanto me abraçava para me proteger do frio da noite. E instintivamente, fico mais calma. 
Fico confusa. Só o mar me acalma. Com a sua música. A sua tranquilidade. Mas desta vez não. Foste tão estúpida. Pois foi. Tratei-o mal, quando ele merecia todo o carinho. Carinho que eu estava disposta a dar-lhe. Ele foi bom para mim e eu fiz-lhe aquilo. Desejo de todo o meu coração para que ele volte. Que ele apareça ali. Queria pedir-lhe desculpa. Pedir-lhe perdão.
Suspiro e encaminho-me para a praia, para a beira-mar e comecei a andar sem destino. Descalço-me e pego nos chinelos. Na minha cabeça, começo a imaginar cenários do que pode acontecer. 
A primeira opção, é de nunca mais o ver. Essa opção inicia uma enorme dor no meu peito. Quero vê-lo. Aliás, acho que nunca desejei tanto ver alguém na minha vida. Se eu nunca mais o vir..
Logo depois, a lógica apodera-se de mim. ‘Tenho tanto interesse em manter esta gruta secreta, como tu tens.’ Isso quer dizer que gosta da gruta. Então vai voltar. Sorrio. Se ele vai voltar, então eu também vou voltar. Decido que irei à gruta esta noite, pode ser que ele esteja lá. Ele vai estar. Tenho a certeza.
A minha mente, voa, para o meu problema: pedir desculpa. Nunca tive que pedir desculpa, por uma razão muito simples: nunca fiz amigos. O meu melhor amigo é o mar. Sempre foi. Sempre irá ser. Talvez não sempre. Afasto este pensamento da minha cabeça. De onde é que isto veio? O mar é o meu melhor amigo e ponto.
Concentro-me no meu objetivo. Pedir desculpa. Os cenários são muitos. Uns bons, outros maus. Ele poderá muito não me desculpar. Aliás, é mesmo o mais viável. Ele não me conhece, não sabe quem eu sou. Para ele, fui uma estranha de quem ele cuidou e que o tratou mal. Sou uma parva que ele não quer voltar a ver. E sou, sou mesmo.
Sou tão estúpida. Ele não me vai desculpar. Porque haveria de o fazer? Sinto-me tão mal comigo mesma. Queria dar um mergulho, mas recuso-me a fazê-lo com tanta gente ali a ver, a invadir o meu paraíso.
Vou-me embora. Já não vale a pena ficar aqui. À noite volto. Volto e mergulho. Volto e falo com ele. Volto e peço desculpa.

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