domingo, 30 de junho de 2013

Num mundo à parte

Num mundo à parte, nós andamos. Vagueamos pelas sombras da noite, como quem não tem lugar para onde ir. Caminhamos pelas estradas abandonadas na esperança vã de encontrar alguém. Com passos em falso, percorremos as ruas, escondidos do sol do dia, tropeçamos nos rebordos do passeio e caímos no alcatrão degradado, juntando mais feridas à coleção que já temos. As roupas já não são roupas, os sapatos já não são sapatos. O calor deixou de fazer impressão, a sede deixou de se notar e já nem a fome nos incomoda. A chuva vem, como que tímida, sem nos querer chatear. Porém, quando entende que já nem isso nos perturba, começa cair com toda a força, formando poças pelo chão, ensopando-nos o cabelo, e colando-nos os tecidos à pele. Sentamo-nos, algures no lugar abrigado, sentido algumas das pingas que atravessaram as pequenas falhas no que em tempos foi um teto. Encostados contra a parede, enrolamo-nos numa bola humana, assaltados por pensamentos que não nos dão descanso. O barulho da água contra o que quer que lhe apareça no caminho desvanece-se, as gotas que persistem em mater-nos o corpo molhado desaparecem e agora não há nada mais do que um vazio. Um espaço oco, desprovido de qualquer tipo de calor. Com a mente entorpecida, deixamo-nos embalar pelo silêncio que nos rodeia. 
Num mundo à parte, nós perdemo-nos. Somos levados pelo meio das pedras, dos arbustos que nos arranham as pernas, das árvores que nos dificultam o caminho, até chegarmos ao lugar onde vento nos bate contra o tronco, emaranhando o cabelo no monte do nós. Aproximamo-nos do cheiro a maresia, que nos envolve num abraço de conforto, como quem pede para ir com ele. Respiramos fundo, deixando os pulmões sentirem aquele ar puro, livre de toxinas ou qualquer outra substância que nos envenena o corpo. Ali, quase que sorrimos, com o sossego que nos rodeia. O silêncio que se ouve. Não era o típico silêncio que nos indica que não há nada, mas sim aquele que nos mostra que irá haver paz, ou talvez, apenas calma. Do tipo de silêncio que nos cativa a querer mais. Com uma marcha segura, percorremos a distância que sobrou. Sentimos o ar debaixo dos pés e, momentos depois, a harmonia do silêncio. 

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