terça-feira, 29 de janeiro de 2013

O mar é fiel 19*

Se há coisa da qual penso nunca ser capaz de me cansar, é disto. O entusiasmo de não saber onde vamos, quando vamos. De não ter o amanhã planeado, de viver sem preocupações, de acordar todos os dias num lugar diferente, com uma vista nunca igual. Nada de monótono, ou aborrecido, apenas o inesperado. O prazer de conhecer o mundo e de o deixar conhecer-me. Estou feliz. Sinto-me livre, quase com quando nadava no mar. Quase. Não ter obrigações, apenas aproveitar o dia até cair para o lado.
Com ele. Sempre com ele, com a sua presença, em espírito e corpo. Acordar ao lado dele. Por vezes ele contempla-me, noutras ainda dorme. Aí, eu fico a vê-lo. Observar o seu peito a subir e a descer, sentir o seu batimento cardíaco nos meus dedos. Com o cabelo despenteado, sem qualquer tipo de máscara ou proteção. Apenas ele. Frágil e vulnerável, tal como me tinha dado a conhecer. O meu pequeno grande sol, que me acompanhava o dia todo, que me fazia rir até doer a barriga. Que me levava às cavalitas sempre que o passeio excedia aquilo que os meus pés aguentavam. Que me dizia cinco vezes à hora 'Lua, o sol está muito forte e tu és branquíssima, tens de por mais protetor'. E que há noite, era a minha melhor almofada e aquecimento. Que por vezes, cantava até eu adormecer. Sabia bem. Preenchia-me o meu pequeno coração e fazia-me querer mais. Mais dele, mais de nós.
- Estás bem, Lua?
- Porque não haveria de estar?
- Estás muito calada - beija-me - e quieta, pensativa.
- Estava só a pensar.
- Em mim? - ele cola-se a mim e roça o nariz na minha cara; sinto-lhe a respiração que causa um ardor nas minhas bochechas e borboletas na barriga.
- Quem sabe, talvez - respondo, com a respiração entrecortada.
- Aposto que era - o seus lábios estão quase nos meus.
- Não és nada convencido deixa-te estar - digo, trocista.
- Ai é? - ele afasta-se - então hoje o convencido já não te toca mais.
- E eu com isso - olho para para o outro lado do parque, parecendo indiferente.
- És má.
Não aguento sem rir. A voz dele lembra-me os das crianças pequenas quando se zangam com o amigo, ou neste caso, a amiga. Quando olho para ele, continua amuado sem sequer mostrar um sorriso, por isso, decido inclinar-me e beijá-lo, mesmo nos lábios. Acende-se um fogo dentro de mim, que jamais quero ver extinto. Ele retorna o beijo e eu sinto uma das suas mãos na minha anca a puxar-me para si, enquanto a outra está no meu pescoço. 
- Eu sabia que não me conseguirias resistir - disse, num murmúrio - é impossível resistir-me.
O ar presunçoso dele dá-me vontade de lhe bater e de o mandá-lo para longe. Mas o problema daquilo que ele disse é que ele sabe que é verdade. Jamais lhe conseguiria resistir, por isso, continuo a beijá-lo, ignorando o resto do mundo. 
- Sabes que mais tarde ou mais cedo vamos ter de voltar, não sabes? - pergunta, quebrando o momento.
Abano a cabeça e inspiro profundamente o ar da noite. 
- Não falemos disso, por favor - peço-lhe - não quero estragar momento. Amanhã ou depois logo vemos isso. Hoje.. simplesmente deixa assim, pode ser?
- Sim pode - diz - seus desejos, são ordens.
- Que parvo - sorrio e encosto-me ao braço dele - para além que daqui a dois dias fazemos 1 ano. Acho que é mais do que motivos para esquecer tudo, ou não?
- Concordo. Onde queres ir amanhã?
- Já estou onde quero estar, Frederico - e fecho os olhos; sei que é verdade, estou precisamente onde preciso de estar.
- Neste parque de campismo reles? - parece surpreendido.
- Não, nada disso.
- Então?
Não digo nada. Com o tempo, ele entenderá.

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