terça-feira, 20 de novembro de 2012

Frágil Ser

Ela era um pequeno ser. Era frágil. Tinha um coração frio, congelado pelas memórias que lhe atormentavam o passado, ferido pela tortura com que havia vivido, partido com a queda do abismo a que a vida lhe tinha conduzido. Ela era muito nova, muito mesmo. Tinha, no entanto, uma vida cheia de horrores, cheia de dores, cheia de sofrimentos. O seu corpo, o seu próprio corpo, era uma amostra disso, era o que mais fazia entender o porquê de chamar ao caminho daquela pequena, o caminho do sofrimento. Os seus braços? Eram repletos de marcas, assim como as suas pernas, fruto de muitas batalhas vividas. Os seus pequenos dedos eram tortos, deformados, de tanto terem escalado montanhas e trepado árvores. Tinha uma cicatriz na sua mão direita, a que muitos chamavam a ‘Marca do Diabo’. Era, a pior, aquela que jamais sararia, assim como as do seu pequeno coração. A sua cara, porém, estava intacta. Tudo no sitio, mas os seus olhos, esses eram escuros, mais escuros que o manto negro que abalava a sua alma, mais negros que o céu que caía sobre o planeta, quando o sol se punha, mais negros que os dias de trovoada. A sua voz? Era fria, desprovida de calor humano, desprovida de amor ou sequer felicidade, desprovida daquele carinho que era tão bem conhecido entre as outras crianças, era apenas e só um som, um barulho que ressoava pelas paredes do seu mundo, pelas paredes do seu escudo protetor. Como poderia uma criança ser assim? Transformar-se em algo tão sombrio? Talvez quem tivesse visto os pais a morrer à sua frente. Alguém que sofreu nas mãos a que muitos chamariam Diabo. Talvez alguém que vivera no meio da floresta apenas com cinco anos, alguém que aprendera a viver com e apenas com animais e plantas. Triste não é? Uma pobre criança, quase um bebé, viver assim, lutar desta forma. Sim, já tinham passado anos desde essas alturas, 5 ou talvez 6, não havia certezas, mas a pequena sonhava com isso, como se tivesse sido ontem, a pequena vivia aquilo no seu subconsciente, dia após dia, semana após semana, ano após ano. A pequena jamais poderia ter uma vida normal, era demasiada dor, demasiadas lembranças. Mas ela já se habituara, a sua vida era assim, perdera os pais e os irmãos mas tinha sido poupada, apenas vira a morte dos pais, os irmãos haviam morrido em batalha da sobrevivência da pequena. Quanta dor as suas almas ainda deveriam sentir, lá em cima, no lugar onde as almas se encontram, onde as almas assistem ao mundo que se vai formando cá em baixo, no chão, no mundo. Desde o acontecimento, ela tinha começado uma nova vida, tinham-na descoberto num dia soalheiro, levaram-na para uma instituição, deram-lhe um lar, comida e roupa lavada. Deram-lhe a oportunidade da vida. O seu psicólogo está para além das capacidades da pequena, jamais conseguiria entender o que se passava na cabeça daquele frágil ser, ele tentava e ela não o culpava, ele sempre a tentara entender, era dos poucos que lhe ainda tentavam dar-lhe a definição da palavra amor. Mas ela não conseguia aprender. As pessoas que lhe deviam ter ensinado essas definições iam lá longe, tinha chegado à meta do seu caminho, já não estavam ao lado dela. Ela queria ver a mãe ao chegar da escola. Ela queria discutir com os irmãos e ‘lutar’ com eles. Ela queria sentir medo, chamar pelo pai, abraçá-lo e sentir-se protegida. Ela queria sair e ir explorar o mundo com a sua família, mas isso não lhe era possível. Ela levava-os para todo o lado, não ao seu lado, mas sim num lugar mas privativo, num lugar mais condicionado – no seu coração. Depois de tudo, ela não sentia. Ela não sentia alegria. Não sentia medo. Não sentia amor. Não sentia carinho. Apenas sentia solidão e dor, apenas e só isso, nada mais.


1 comentário:

Anónimo disse...

Tão lindooo *-* amei