domingo, 7 de outubro de 2012

O mar é fiel 15*

Eu pensava que vê-lo sorrir, era belo, mas vê-lo dormir, é algo ainda melhor. Acaricio-lhe a cara, levemente, para não o acordar. Sinto a pele macia por debaixo da ponta dos dedos, O peito dele levanta-se tão suavemente. Quem me dera poder ficar ali, a vê-lo, a tocar-lhe. Era tão bom. Parece um anjo. 
Levanto-me a calço-me, amaldiçoando o facto de ser quinta-feira e de ter escola. A escola é uma verdadeira seca. Gente sem nada para fazer que não seja meter-se na vida dos outros. E o pior de tudo: são horas preciosas longe dele. Seria muito mau se faltasse hoje? Era só um dia..
Dou-lhe um último beijo, com cuidado, não o quero acordar, é demasiado cedo para isso. Pego na mala e caminho até à porta, cuidadosamente para não fazer barulho. 
- Lua?
Fogo.
Olho para trás e vejo-o, sentado, com a cara cheia de sono, imenso mesmo. 
- Desculpa, acordei-te?
Ele abana a cabeça, em sinal negativo e depois olha-me, com aqueles olhos sonolentos. Sinto-me a morrer.
- Onde vais? É tão cedo…
- Tenho escola e ainda tenho de passar por casa para ir buscar os livros.
Ele parece desanimado, verdadeiramente desanimado. 
- Mas já? É tão cedo - repete.
Vou até à beira dele e sento-me, dando-lhe outro beijo.
- Logo à tarde já me aturas outra vez, certo?
- Mas ainda falta tanto tempo para logo à tarde – ele pega na minha mão que lhe está a acariciar o peito e beija-a – vou morrer de saudades da minha princesa, entretanto.
Sorrio.
- Da tua princesa?
Ele aproxima-se e sussurra-me ao ouvido:
- Só minha.
Sorrio ainda mais e deito-me em cima dele, obrigando-o a encostar-se.
- Pensa na noite que passámos e as saudades vão logo embora – digo-lhe e ele sorri-me, aquele sorriso traquina que me faz amá-lo ainda mais.
- Sabes o quão bom é, saber que confias em mim o suficiente para termos tido uma noite assim?
- Porque não haveria de confiar?
Ele encolhe os ombros.
- Não sei..
- Tu não confias em mim?
- Claro que confio!
- E porque? Sabes ainda menos de mim do que eu de ti...
- Mas eu sei que tu não me mentes, eu sei que não.
Ele beija-me.
- Eu também sei que tu não me mentes.
Abraço-o. Sentir o seu corpo junto ao meu, é algo tão bom, mas tão bom.
- Gostaste...?
- Não…
- Não?! – levanta-se tão rápido, que tenho de me agarrar ainda mais ao seu pescoço para não cair.
Rio-me, e a gargalhada espalha-se pela divisão. Ele parece extremamente alarmado.
- Não – digo, enquanto lhe afasto os caracóis da frente dos olhos. E num sussurro, acrescento – eu amei.
- Parva, nunca mais faças isso - ele ri-se. Eu amo ouvi-lo rir-se - eu também amei.
E beija-me. Faz-me sentir viva 
- Eu amo-te. Sabes disso, não sabes?
Sorrio e toco com o meu nariz no dele. Como é que alguém pode sentir tamanho sentimento?
- Só se souberes como eu te amo.
Ele não responde. Beija-me de novo e eu entrego-me ao beijo, por completo. Sinto as mãos dele a subirem-me pelas costas e obrigo-me a afastar os lábios.
- Mas por mais que eu te ame, há uma coisa chamada ‘escola’ e outra chamada ‘minha mãe’ que me vai matar se eu começar a faltar, por isso… - e dito isto levanto-me, o que o deixa visivelmente desapontado.
- Vais ter comigo à gruta logo, depois da escola?
- Aparece, e descobres – digo e ele sorri-me.
Pego na mala e saio. Ainda o oiço falar, antes de fechar a porta.
- Até logo!

Sem comentários: